Recuo dos EUA reflete imprevisibilidade de Trump, e não vitória diplomática do Brasil
Redação
Avaliação
O recuo dos Estados Unidos em medidas adotadas contra o Brasil e autoridades do Judiciário brasileiro está mais ligado ao comportamento errático do presidente Donald Trump e à mudança de sua visão sobre Jair Bolsonaro do que a uma articulação diplomática bem-sucedida do governo Lula. A avaliação é de John Feeley, ex-embaixador dos EUA no Panamá e ex-integrante do Departamento de Estado, em entrevista à BBC News Brasil.
Segundo Feeley, Trump passou a tratar Bolsonaro como um aliado descartável após sua condenação e prisão. Para o ex-diplomata, o republicano não tolera derrotas. “Assim que Bolsonaro perdeu, Trump o viu como um perdedor, e perdedores não fazem parte do seu círculo”, afirmou. Na análise de Feeley, o Brasil nunca ocupou um lugar central nas preocupações do presidente norte-americano, que age de forma altamente pessoal e imprevisível.
Essa característica, segundo ele, torna qualquer negociação instável. Ao comentar a suspensão das tarifas adicionais de 40% sobre produtos agrícolas brasileiros e a retirada do ministro Alexandre de Moraes e de sua esposa da lista da Lei Magnitsky, Feeley avaliou que o governo brasileiro teve mais sorte do que mérito diplomático. Para o ex-embaixador, líderes internacionais deveriam, sempre que possível, manter distância da órbita política de Trump.
Feeley também atribuiu as sanções iniciais e as tarifas ao lobby feito por Eduardo Bolsonaro em Washington após o avanço dos processos contra o ex-presidente. Na sua avaliação, não houve uma estratégia institucional clara do Departamento de Estado, mas sim reações pontuais estimuladas por pressões políticas externas.
Ao ampliar a análise para a política externa dos EUA, Feeley comentou a situação da Venezuela, defendendo que bloqueios a navios petroleiros têm sido mais eficazes do que ações anteriores, embora reconheça impactos colaterais. Ainda assim, rejeitou a tese de que as sanções sejam a principal causa da crise humanitária no país, atribuindo o cenário ao modelo econômico adotado pelo governo de Nicolás Maduro.
Por fim, o ex-embaixador afirmou que Trump não atua com base em uma estratégia bem definida, mas em impulsos e cálculos políticos internos. Apesar disso, avaliou que o Brasil pode exercer um papel simbólico relevante ao demonstrar resiliência democrática, especialmente após os ataques de 8 de janeiro. Para Feeley, mais do que um mediador regional, o país pode servir de exemplo institucional até mesmo para a sociedade norte-americana.