Opinião: Entre o Real e o Postiço


04/07/2024 às 15:00
Fabio Luz

Artigo

As eleições brasileiras, sejam as nacionais ou as regionais, não costumam guardar grandes surpresas. Analistas políticos quase sempre acertam, à guisa de pedra cantada, o desenrolar dos acontecimentos ulteriores durante as campanhas e, com alguma precisão, desenham num possível cenário eleitoral as mais altas probabilidades do que se pode, de fato, acontecer.

Todavia, tudo isso mudou com a eleição de Bolsonaro, em 2018, que, com majoritário apoio vindo da força das redes sociais, superou expectativas das prospecções mais adiantadas e frustrou, inclusive, institutos de pesquisas eleitorais famosos assim que se começou a projetar um futuro menos opaco das tendências estatísticas eleitorais na época. O que, 6 anos depois, gerou naqueles que são dados a palpites, maiores prudências em suas mais apressadas conclusões ao também considerarem o efeito de alavanca das “redes sociais” como uma variável realmente impactante no resultado final.

Em 2022, nas eleições presidenciais, Bolsonaro perde para Lula por pouco, mas, apesar do seu ofuscamento e toda polêmica em que se meteu desde então, seu carisma exerce atração suficiente em seus eleitores para influenciá-los decisivamente segundo suas indicações. Bolsonaro tem feito todo o possível para exercer influência ideológica e comando direto de seus aliados nas eleições municipais de 2024 a fim de provar que seu nome e poder de decisão ainda continuam bem vivos para boa parcela dos eleitores brasileiros.

Em Várzea Grande, a advogada Flávia Moretti, parece ser a grande protegida de Bolsonaro e é a principal concorrente do favorito ao pleito do Paço Couto Magalhães, Kalil Baracat, cuja senioridade e grande habilidade para formar alianças coerentes e poderosas, construídas nos últimos anos ao lado das maiores sumidades políticas locais, profundamente influentes, será um enorme obstáculo para o êxito da candidata bolsonarista.

Seus respectivos perfis

A advogada, Flávia Moretti (PL), é uma mulher com um currículo invejável. Advogada experiente, com mais de 24 anos de ofício, por 12 anos foi diretora da OAB 5ª Subseção Várzea Grande. Está na linha de frente no combate contra a violência doméstica e na luta pelos direitos da mulher há tempos. Fez parte do Conselho Municipal dos Direitos das Mulheres de Várzea Grande e também da CONCIDADE (Conselho da cidade de Várzea Grande).

Filiada ao PL, seu perfil é bastante conservador e seu patrono principal é o ex-presidente Jair Bolsonaro. A composição de sua chapa eleitoral, o ex-prefeito Tião da Zaeli (PL), será possivelmente mais do que um vice, mas um mentor, dado sua experiência política. Sua base aliada se compõe de apenas três partidos, além do próprio PL, que são o Podemos, o DC e o PRTB.

Já o atual prefeito de Várzea Grande, Kalil Baracat (MDB), é um empresário e político sênior na cidade. Já foi vereador em 2012 e escolhido como líder do ex-prefeito, Wallace Guimarães, e, posteriormente, em 2016, por seu brilho político, é chamado a ser secretário de desenvolvimento econômico e, em 2019, também secretário de governo na gestão da ex-prefeita do município, Lucimar Campos. Político experiente, acumula um cabedal de aliados muito vantajoso.

Somam 10 partidos em sua base aliada: Agir 36, Novo, Cidadania PDT, PP, PRD, PSB, PSDB, Republicanos, União Brasil e, claro, o próprio MDB, seu atual partido, o que, em outras palavras, garantirá provavelmente sua governabilidade, se eleito, além de dispor de maior tempo nas chamadas do horário eleitoral.

Mas, afinal, Kalil contra Flávia: o que está definitivamente em jogo aqui?

Trata-se de uma disputa entre uma mulher empoderada contra um homem padrão? É uma conservadora contra um centrista? São porventura visões de mundos diferentes que se colidem e se consubstanciam em propostas diferentes de governo ou são ambos de uma mesma natureza tal que se está disputando as eleições para fazerem rigorosamente as mesmas coisas, embora nominalmente díspares?

Flávia Moretti oficializará na Justiça Eleitoral, no próximo 22 de julho, seu nome e de seu vice; a data é em referência ao número eleitoral de Bolsonaro. Que isso quer dizer? É uma maneira de sinalizar para o eleitorado bolsonarista que ela está pleiteando não para ser a Flávia, mas o próprio Bolsonaro. Isso, entretanto, é possível?!

A propósito, o que isso quer dizer senão o de que o prestígio da pré-candidata está totalmente colado e em função do prestígio do ex-presidente. Ora, como alguém que se sugere empoderada e se apresente como independente, pode ser tão condescendente dessa forma senão talvez pela gana em conquistar facilmente eleitores à direita? Uma coisa é ter aliados, outra é ter uma eminência parda por detrás de si. Isto convém à população várzea-grandense?

O que acontece se Bolsonaro retirar o seu apoio? O histórico da ilustre pré-candidata se sustentará sozinho? Lembre-se do que aconteceu com o ex-presidente da Embratur, João Dória Junior, também ex-prefeito de São Paulo capital e ex-governador do estado homônimo mais rico e influente do Brasil: assim que Bolsonaro se voltou contra ele e retirou seu apoio, foi desidratado até se tornar apenas um párea político e cair em completo ocaso, aniquilado, sendo expulso do seu próprio partido de origem. O que se pode pensar, então, se se acontecer o mesmo com Flávia Moretti, assim que os ventos alísios políticos soprarem para outras direções à sua revelia?

O que, então, está em jogo? Não é um combate entre duas ideias diferentes, de dois projetos diferentes, de duas ideologias diferentes, é simplesmente e, sobretudo, a diferença entre uma candidatura fantoche, descaracterizada, e uma candidatura sólida, com uma personalidade bem estabelecida e situada. Isto é, uma se sustenta inteiramente na fama de um ex-presidente, e o outro se sustenta por si mesmo. Quem, nessas condições, demonstra preparo senão o que, com o peso de sua experiência, amealhou capital político tal através de méritos próprios perante a sociedade várzea-grandense?

Quem tem, assim sendo, maior credibilidade: o real ou o postiço?

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