Educação sexual na escola pode evitar casos de abuso; saiba o que as crianças devem aprender


 - Foto: Divulgação
15/09/2023 às 08:50
g1

Educação

O que se espera das escolas, quando psicólogos e entidades como a Unesco (Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura) defendem educação sexual para crianças? Por que eles recomendam que o tema seja abordado pelos professores desde cedo?

Fique tranquilo: são conteúdos que passam longe de qualquer risco de erotização precoce. A intenção é ensinar seu filho ou filha a: se cuidar, entender como fazer a higiene íntima, conhecer o próprio corpo e se proteger de casos de abuso.

Nesta reportagem, entenda:

  • por que a escola deve participar do processo;
  • as razões de a educação sexual não "adultizar" as crianças;
  • a forma de trazer abordagens leves e lúdicas para temas “pesados”;
  • a importância da parceria com a família;
  • a melhor solução para as dúvidas (repetidas) dos alunos;
  • o aspecto fundamental de formar professores.

Quer um exemplo de dinâmica? No Instituto Criança é Vida, que promove atividades de educação sexual no contraturno escolar para crianças em vulnerabilidade, os alunos de 7 a 9 anos aprendem o que é menstruação.

“Compramos tinta guache vermelha para fazer uma atividade. Alguns colocam algumas gotinhas no absorvente, outros, mais, para aprenderem que as mulheres têm diferentes fluxos menstruais”, explica Regina Stella, diretora superintendente. “Depois, ensinamos a descartar direitinho, sem deixar o absorvente aberto no lixo.”

Os resultados do projeto ficaram evidentes quando uma das meninas menstruou na escola e sujou o uniforme – os meninos, que também haviam participado da dinâmica, em vez de fazerem piadas inapropriadas, acolheram a amiga e arranjaram um casaco para ela amarrar na cintura e cobrir a mancha de sangue.

“Misturar os educandos é importante, porque todos precisam aprender a se colocar no lugar do outro”, afirma a psicóloga Ana Cláudia Bortolozzi, da Universidade Estadual Paulista (Unesp).

“Defendo que a educação sexual esteja presente sempre no currículo: é com informação que vamos ensinar noções de prevenção e respeito. Sexualidade é uma dimensão humana – desde cedo, as crianças devem saber os nomes das partes do corpo e distinguir se um toque [de alguém] é errado ou não”

Mas é papel da escola?

Há grupos de pais que defendem a educação sexual como dever apenas da família, e não da escola. As próprias políticas do Ministério da Educação (MEC) nos últimos governos sofreram um vaivém de posicionamentos quanto à inclusão do tema em sala de aula.

  • A Base Nacional Comum Curricular (BNCC), por exemplo, - aquele documento que prevê os conteúdos mínimos que devem ser ofertados pelas redes de ensino -, tinha, em suas três primeiras versões, menções a “sexualidade e gênero” de uma forma mais crítica e reflexiva. Diante da resistência de certos setores da sociedade, o MEC retirou o conteúdo da versão oficial da BNCC.
  • Atualmente, o documento restringe-se a conteúdos sobre puberdade, métodos contraceptivos e mudanças hormonais (e apenas a partir do 8º ano do ensino fundamental). Com exceção do trecho que fala “nas múltiplas dimensões da sexualidade humana”, todas as referências ao tema são focadas em aspectos biológicos.

Outro exemplo de divergência em políticas públicas é o Programa Saúde na Escola, iniciado em 2006, com o objetivo de levar às escolas públicas ações de prevenção, promoção e atenção à saúde:

Trabalho conjunto

Crianças aprendem a cuidar da higiene íntima — Foto: Reprodução/Arquivo Instituto Criança é Vida

Crianças aprendem a cuidar da higiene íntima — Foto: Reprodução/Arquivo Instituto Criança é Vida

Para os especialistas ouvidos pelo g1, é importante que as famílias estejam ao lado das escolas na tarefa de ensinar as crianças a conhecer o próprio corpo, a entender as noções de intimidade e a se proteger de casos de abuso.

“Na realidade brasileira, as crianças vão muito cedo para a escola e passam a maior parte do tempo lá. Entra aí a responsabilidade da educação infantil de ensinar as noções de autocuidado para os pequenos. Não ensinamos o que é nariz, o que é olho? É importante que saibam o nome dos órgãos genitais também”, diz Angelita Wisnieski, psicóloga infantil do Hospital Pequeno Príncipe (PR), o maior hospital exclusivamente pediátrico do país.

“Não falar disso é mostrar para as crianças que esse assunto é tabu. Precisamos tratar como algo natural.”

Quando seu filho entende o nome do pênis e da vagina, por exemplo, estará preparado para relatar às pessoas de confiança (sejam os pais, os avós ou os professores) se alguém pedir para ver essas regiões ou tocar nelas.

Os assuntos vão surgindo no dia a dia da escola, de forma espontânea. Imagine na hora de todo mundo brincar no tanque de areia do parquinho: o professor deve ensinar que, com as mãos sujas, não podemos encostar nas nossas partes íntimas, conta Marta Gonçalves, psicopedagoga e professora no Instituto Singularidades (SP).

“Até o ato de enxugar o xixi, que é diferente para meninos e meninas, deve ser ensinado desde cedo.”

Regina, do Instituto Criança é Vida, conta que os educadores do projeto costumam incentivar essa parceria com as famílias dos alunos. “A gente convida as crianças a contar em casa o que aprenderam, como a forma correta de higienizar o pênis, por exemplo. Muitos adultos não sabem o que fazer.”

Pode haver um estímulo à erotização precoce?

Nas últimas semanas, as palavras “sexo” e “escola” apareceram juntas em dois contextos problemáticos: no caso da diretora de uma creche, no Rio, que ensinou uma coreografia de funk para as crianças (“brisa aê, que hoje a noite é de prazer”, dizia a letra), e no episódio em que uma mulher, usando uma máscara de cavalo em um evento cultural, dançou uma música com teor sexual na frente dos alunos pequenos ("vem, mulher, vem galopando”).

São duas situações que nada têm a ver com educação sexual.

“Existe diferença entre sexualidade e sexualização. A sexualidade é inata ao ser humano e deve ser compartilhada de forma saudável, para que a criança tenha intimidade com seu próprio corpo e possa conhecê-lo e protegê-lo. Já a sexualização precoce vem de fora e ‘adultiza’ a criança – faz com que ela repita comportamentos inapropriados para a sua idade”, afirma Renata Franco, psicóloga especialista em comunicação não violenta.

Ela explica que as músicas até podem ser um recurso lúdico interessante para a educação sexual, desde que as letras sejam “ajustadas à linguagem da criança, para que seja feito um trabalho de maneira mais cuidadosa e responsável”.

Falar de abuso com crianças? Isso não é ‘pesado’?

Já os pezinhos e os ombros recebem o “sinal verde”, e a virilha e as coxas, o “amarelo”.

“É importante que eles entendam que há o toque de carinho, de quem a gente ama, e o toque ruim, que é desconfortável, que dá medo e que faz com que tenham vergonha de contar para outras pessoas”, diz a professora.

Para que se lembrem de tudo isso, uma música (que fez sucesso!) é cantada em conjunto.

E se a família discordar da abordagem?

É importante que todas essas atividades de educação sexual feitas pela escola sejam comunicadas previamente para as famílias dos alunos. No caso do “semáforo do toque”, por exemplo, “os pais ficaram tranquilos quando viram que nada daquilo despertaria para o sexo, e sim ajudaria na prevenção”, diz a professora Fernanda.

A psicóloga Rita Calegari reforça que o diálogo é fundamental. “Os pais precisam saber o que está sendo proposto na grade curricular. Mas também devem sempre estar abertos para entender que a escola tem um papel social. Não existe o ‘não quero que falem isso, então, não vão falar’. As decisões precisam estar alinhadas”, afirma.

O ideal é que, antes de fazer a matrícula, os responsáveis pela criança já se informem sobre as propostas pedagógicas. No caso da rede pública, em que nem sempre é possível escolher um colégio específico, os responsáveis podem participar das reuniões, expor suas preocupações e ouvir as propostas dos professores. É um trabalho coletivo.

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