Dinheiro caiu na minha conta por engano: tenho ou não direito de ficar?
Redação
Conhecimento
Um idoso recebeu um susto ao abrir a conta bancária e verificar um saldo de R$ 131 milhões. Antônio Pereira do Nascimento, de Palmas, no Tocantins, ficou milionário de repente por causa de um erro do banco Bradesco. Assim que percebeu o dinheiro disponível, o idoso, que é motorista, não pensou duas vezes e entrou em contato com a instituição para devolver o dinheiro. Este episódio fez muita gente perguntar se, em casos de engano, tem ou não direito sobre o dinheiro.
Especialistas consultados pelo Terra são enfáticos em dizer que quem recebe dinheiro por engano não tem direito de ficar com o valor. O argumento jurídico que obriga o valor depositado por engano a ser devolvido está baseado no Código Civil, que em seu artigo 876 estabelece que "todo aquele que recebeu o que lhe não era devido fica obrigado a restituir".
“Caso o valor não seja ressarcido, a conduta pode até configurar o crime de apropriação indébita, conforme previsto no Código Penal, com pena de detenção de um mês a um ano ou multa, para quem se apropriar de coisa alheia vinda ao seu poder por erro ou caso fortuito”, diz João Lessa, advogado e professor de direito da Universidade Presbiteriana Mackenzie Alphaville.
Rafael Quaresma, advogado especialista em direito do consumidor, também utiliza o mesmo artigo para reforçar a ideia que o valor deve ser devolvido. “Caracteriza o que a lei chama de enriquecimento sem causa e por isso é passível de devolução ou de exigir a devolução”, explica Quaresma. O enriquecimento à custa de outra pessoa é proibido, independentemente de a transferência ter sido realizada por uma empresa ou uma pessoa física.
Recebi, mas não notei a quantia e gastei
De acordo com os especialistas, o uso, ainda que por engano, do dinheiro recebido indevidamente constitui enriquecimento sem justa causa, e a obrigação de devolver o valor permanece, independentemente de o erro ter sido cometido por um banco ou por uma pessoa física.
“O fato de o dinheiro ter sido gasto não afeta o dever de ressarcir o legítimo titular. O banco pode descontar o valor transferido por engano caso haja saldo positivo na conta favorecida ou, em alternativa, solicitar a devolução ao correntista. Em caso de recusa de devolução, poderão ser adotadas medidas judiciais para a cobrança do valor”, alerta João Lessa.
O titular do valor depositado indevidamente, seja o banco ou a pessoa física, pode propor ação judicial para obter a restituição do valor. “Usei o dinheiro, mas eu tenho um carro, um imóvel ou algum bem com aquele valor, tudo isso poderá ser utilizado para fazer frente à condenação, ao pagamento da dívida ou a devolução do valor”, explica Rafael Quaresma.
Dinheiro caiu, mas minha conta está negativada e o banco “comeu”
Nesse caso, os especialistas também afirmam que a obrigação da devolução, pois a situação ainda configura um enriquecimento indevido, considerando que o favorecido foi beneficiado com o abatimento de saldo devedor. A devolução deve ser providenciada de qualquer modo, pois ainda haverá a obrigação de restituir o valor obtido com atualização monetária.
“Já vi isso em um caso concreto. O pix ter sido feito para a conta errada, esta conta está negativa e aí o problema toma uma outra proporção, porque não seria apenas uma questão de índole, boa fé ou não, da pessoa que recebeu o valor incorretamente em querer devolver. Mas isso não desobriga a pessoa, pois segue a regra do enriquecimento sem causa”, acrescenta Quaresma.
Caso do idoso
Embora tenha devolvido o dinheiro, a defesa do idoso alega que ele tem direito ao percentual de 10% do valor que foi encontrado em sua conta bancária em junho de 2023. O pedido é baseado no artigo 1.234 do Código Civil, que determina que, em caso de restituição de coisa achada, a pessoa tem direito a uma recompensa não inferior a 5% do montante.
A defesa pede, além de uma recompensa de mais de R$ 13 milhões, uma indenização de R$ 150 mil por danos morais. Correntista do Bradesco há 25 anos, idoso recebeu R$ 131.870.227,00 em junho de 2023. O Terra procurou o Bradesco para saber um posicionamento do banco diante do processo. Em resposta, a instituição financeira respondeu que "não comenta caso sub judice".
Fonte: Terra