Prioridade econômica e desejo de mudança: o que explica o avanço de Trump entre os latinos
Redação
Entenda
A eleição de Donald Trump para a Presidência dos Estados Unidos foi marcada por um fortalecimento do republicano em relação à disputa de 2020, quando foi derrotado por Joe Biden, na maior parte dos grupos do eleitorado. Um dos mais expressivos foi o de imigrantes latinos.
Pesquisas de boca de urna da emissora americana “NBC” mostraram que o presidente eleito teve 54% dos votos de homens latinos, contra 44% da vice-presidente Kamala Harris. No pleito que perdeu, o republicano teve a preferência de 36% desse grupo.
O eleito ainda avançou no extrato dos “blue-collar” (trabalhadores sem ensino superior) onde chegou a 55%, cinco pontos a mais do que quatro anos atrás. O histórico de declarações xenófobas e a promessa de deportar um número recorde de imigrantes no novo mandato não afastou esses eleitores de Trump, como o site IstoÉ explica neste texto.
Homem ergue um cartaz que diz “Latinos por Trump”: apoio já era relevante nas eleições de 2020 | AFP
Lupa nos números
Uma pesquisa da agência “Associated Press” identificou que os democratas são associados a pautas como a defesa da democracia e dos direitos reprodutivos, enquanto os latinos foram votar munidos pela preocupação com os índices de inflação e os custos de saúde e domicílio no país, riscos que não foram expressados pela campanha de Kamala.
Para analistas locais, como Chuck Todd, da emissora “NBC News”, os democratas trataram os eleitores latinos como um “grupo identitário”, enquanto republicanos os abordaram da mesma forma que os trabalhadores brancos. “Acho que estamos vendo uma espécie de coalizão da classe trabalhadora se desviando para a direita”, afirmou.
Em um comício na Pensilvânia na semana da eleição, Trump prometeu “o melhor futuro a portorriquenhos e latinos”, enquanto sua adversária daria “crime e pobreza”. O governo Biden — representado por Kamala nas urnas –, por sua vez, amargava índices elevados de inflação.
Em entrevista ao “USA Today”, Muñoz, um imigrante latino e motorista de caminhão de 28 anos, relatou que sua situação econômica piorou durante a gestão democrata. “Latinos e hispânicos trabalham duro, [mas] notei a diferença no pagamento, nas horas trabalhadas e no provimento da família nos últimos quatro anos”, disse.
O presidente dos EUA, Joe Biden, e sua vice-presidente, Kamala Harris: índices econômicos explicam impopularidade entre latinos | AFP/Arquivos
Mudança no bolso
Para Paulo Vicente, professor de gestão pública da Fundação Dom Cabral, o avanço de Trump e a queda de Biden não podem ser distanciados. “O governo não conseguiu lidar com problemas de inflação, que são uma preocupação central da população trabalhadora. A percepção é de que a gestão era ruim e Kamala não apresentou propostas efetivas de melhoria“, disse ao site IstoÉ.
“Trump ganhou popularidade entre os latinos, mas também nos outros extratos e estados americanos, à exceção de Washington e Utah. Esses números expressam a busca de uma alternativa de oposição”, afirmou Vicente.
Neusa Bojikian, pesquisadora do programa de pós-doutorado em ciência política da Unicamp e do INCT-INEU (Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia para Estudos sobre os Estados Unidos), disse ao site IstoÉ que os números de Trump entre imigrantes refletem a “individualização dos grupos”, que não estão diretamente associados a uma preferência partidária.
“Quando um imigrante trabalhador ouve de Trump que ele irá resolver seu problema de moradia e melhorar sua renda, isso transmite uma mensagem muito direta. A prioridade é a questão econômica“, afirmou.
De acordo com a pesquisadora, o perfil majoritário do imigrante nos EUA está ligado à lógica do ‘self made man’. “São pessoas que foram atrás de seus objetivos, conseguiram comprar uma casa e enviar dinheiro para suas famílias. A ideia de ter um presidente forte, que se destacou economicamente e terá firmeza para defender os trabalhadores, é muito interessante para esse eleitorado”, disse.
Fonte: IstoÉ